sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O Exercício Físico é de ‘Pouco Proveito’?

O exercício físico é de pouco proveito; a piedade, porém, para tudo é proveitosa, porque tem promessa da vida presente e da futura (1Tm 4.8).

Se andar fizesse bem à saúde, os carteiros seriam imortais”. Escutei essa frase humorística em um hospital quando um colega tentava persuadir seu paciente, durante uma consulta médica, a se dedicar a uma rotina de exercícios físicos.

Os exercícios físicos são, inegavelmente, benéficos à saúde e à manutenção de um envelhecimento com menor risco de complicações. A maior causa de mortalidade no mundo ainda é a doença cardiovascular. E, especialmente em relação a ela, a alimentação saudável e exercícios físicos adequados à faixa etária e limitações físicas são fundamentais para retardar os seus surgimentos.

Todavia, qual é a quantidade ideal de exercícios físicos a que meu colega se referia ao orientar o seu paciente? Qual é a quantidade mínima de exercícios físicos que um ser humano adulto, independentemente do sexo, deve praticar para que tenha benefícios, tais como o controle do sobrepeso, obesidade, hipertensão (pressão alta), dislipidemia (colesterol alterado), diabetes tipo 2 e doença arterial coronariana (entupimento das artérias coronárias que podem causar infarto do coração)?

É ponto comum que o controle dos fatores supracitados e o retardamento dos seus surgimentos aumentam não só a expectativa de vida, mas a qualidade de vida [1]. Profissionais da área de saúde devem auxiliar na prescrição de exercícios físicos, principalmente se o caso é de sedentarismo há algum tempo.

Os estudos clínicos demonstraram que a rotina de atividade física de moderada intensidade (atividade em que a frequência cardíaca permanece entre 70% e 80% da frequência cardíaca máxima ou de pico) com duração de trinta minutos, cinco vezes na semana, de forma contínua ou acumulada (que pode ser feita de uma só vez ou dividida no dia, como dois períodos de quinze minutos ou três períodos de dez minutos) é benéfica no combate a todos os problemas de saúde anteriormente listados [1].

Para as pessoas que não querem se debruçar sobre contas matemáticas, o exercício físico de “moderada intensidade” é aquele da “caminhada ligeira”. Ou seja, aquela caminhada de alguém que está com pressa para chegar a algum lugar, como se estivesse atrasado para um compromisso. Para aqueles que gostam de calcular exatamente como deve ser o exercício, segue uma das fórmulas utilizadas para a prescrição de exercícios:

Valor mínimo da frequência cardíaca durante o exercício: (220 – sua idade) x 0,7.
Valor máximo da frequência cardíaca durante o exercício: (220 – sua idade) x 0,8.

Em linhas gerais, esses dois cálculos nos dão o intervalo em que a frequência cardíaca deve permanecer durante o exercício. Se a sua atividade física estiver abaixo do valor mínimo, o exercício não está atingindo a intensidade desejada. Se o valor de sua frequência cardíaca estiver acima do valor máximo, o exercício está mais intenso do que o tolerado e o estado de fadiga rapidamente surge. A utilização de relógios com frequencímetros pode ajudar a manter a atividade física na faixa indicada.

Logo, percebemos que não é preciso muito tempo para promoção da boa saúde por meio dos exercícios físicos. Considerando o período de uma semana, os exercícios físicos que os médicos orientam seus pacientes a se dedicar compreendem apenas 1,5% de todo o tempo da semana.

Entretanto, o exercício físico se encaixaria na máxima “quanto mais, melhor”? Parece que o relativismo dos tempos pós-modernos tem suas exceções. Uma delas é a percepção de que os padrões de beleza dos profissionais que dependem de sua aparência devem ser imitados por todos os outros “mortais” que não têm tempo e dinheiro para investir na obtenção do “corpo perfeito”. Ademais, corpos esbeltos e surpreendentemente delineados apenas são sinônimos de eternidade entre as divindades gregas, ou seja, na mitologia grega. Enfim, um mito! Veja, abaixo, os resultados de algumas evidências científicas e note como há um limite para obsessão por exercícios físicos.

Um estudo polonês se propôs a avaliar uma interessante variável: a longevidade comparativa entre atletas olímpicos, atores e atrizes, e monges e freiras poloneses [2]. Os dados de mortalidade, coletados entre 1946 e 2000, de 7.576 poloneses de ambos os sexos, foram avaliados. Todas as pessoas gozaram uma juventude saudável, mas optaram por diferentes profissões com intensidade e duração de atividade física distintas. É curioso notar a inclusão de atores e atrizes que normalmente praticam exercícios físicos não para fins esportivos, mas para fins de manutenção da saúde e estética. A análise estatística demonstrou que, entre os homens, os atletas obtiveram maior longevidade (mediana de 80,4 anos) que os atores (mediana de 73,3 anos). Já entre as mulheres, as curvas das três profissões se mostraram muito próximas e não houve diferença estatística significativa. Os resultados (em média e desvio-padrão) foram sumarizados na tabela abaixo:

HOMENS
MULHERES
Atletas
77,7 (0,7)
Atletas
79,1 (1,6)
Atores
72,3 (0,4)
Atrizes
78,3 (0,5)
Monges
74,8 (0,8)
Freiras
79,4 (1,0)

Uma ótima revisão sobre a mortalidade e longevidade de atletas de elite foi publicada recentemente, em 2010 [3]. Nessa revisão, diversos estudos epidemiológicos das mais diversas modalidades esportivas foram analisados conjuntamente e os resultados demonstraram que os atletas de elite vivem um pouco mais que a população geral. Todavia, essa diferença é bastante variável e, em algumas modalidades esportivas, como os jogadores italianos de futebol profissional, não existe diferença alguma na longevidade em relação à população geral. As diferenças na longevidade foram sumarizadas na tabela abaixo:

MODALIDADE ESPORTIVA
INCREMENTO NA LONGEVIDADE (EM ANOS) EM RELAÇÃO À POPULAÇÃO GERAL
Corredores de longa distância ou esquiadores cross-country
2,8 – 5,7 anos
Futebol, hóquei, basquete, saltadores, corredores de curtas ou médias distâncias, corredores com barreira
4,0 anos
Futebol americano ou Rugby
6,1 anos

Até mesmo a hipótese de que os esportes com mais contato (classificados pelos leigos como “violentos”), como o boxe, detinham piores índices de longevidade foi estudada [4]. Os autores cogitavam que boxeadores poderiam viver menos que outros atletas de modalidades com menos ou ausente contato, como a natação e o tênis. Os autores concluíram que o tipo de esporte e sua quantidade de contato com o adversário não influíram na longevidade dos atletas. Embora a maior diferença de longevidade tenha sido encontrada entre boxeadores (73 anos) e tenistas (79 anos), essa diferença não foi estatisticamente significativa.

Se a expressão “quanto mais, melhor” não se harmoniza perfeitamente à prática de exercícios físicos em relação à longevidade, poderia ser o esporte, então, um instrumento para alcançar honra e glória?

Vejamos a opinião dos antigos gregos, detentores da “patente” dos Jogos Olímpicos: os jogos transcendiam o desempenho físico e estavam intimamente relacionados à religião, especialmente ao culto de Zeus. Logo, os vencedores das provas eram admirados em uma atmosfera religiosa com mais significado e glória que uma simples competição esportiva. Todavia, até mesmo nesse contexto, os nomes dos atletas foram esquecidos e a fama e glória se esvaíram antes mesmo que suas vidas chegassem ao fim.

Atualmente, não é diferente: fama e glória se perdem como areia entre os dedos dos atletas. Para exemplificarmos quão fugaz é a glória que o esporte traz, notemos os recordes de atletismo dos últimos Jogos Olímpicos, em Pequim (2008): dezessete recordes foram quebrados nesses jogos, dez entre os homens e sete entre as mulheres. O recorde mais antigo entre os homens é do americano Bob Beamon, no salto em distância, em 1968, nos Jogos Olímpicos do México. Entre as mulheres, o recorde mais antigo pertence à Nadezhda Oligarenko, da ex-União Soviética, na prova dos oitocentos metros, em 1980, em Moscou.

Se mesmo entre esses antigos recordes, a glória e fama não perduram, o que podemos dizer daqueles que já tiveram seus recordes quebrados? O que dizer daqueles que subiram ao pódio, mas não quebraram recordes? O que dizer daqueles que apenas conseguiram participar dos jogos e não alcançaram qualquer medalha? E quanto àqueles que investiram toda a sua juventude e sequer alcançaram expressão no âmbito nacional?

Invariavelmente, se o esporte for usado primariamente para alcançar honra e glória, a frustração é o que o homem pode esperar. Não devem ser raros os casos de depressão após os Jogos Olímpicos, até mesmo entre aqueles que obtiveram bons resultados.

O apóstolo Paulo, movido pelo Espírito Santo, contrapôs a efemeridade da atividade física (do grego gumnasia) à piedade (do grego eusebeia). A palavra gumnasia aparece apenas uma única vez no Novo Testamento (1Tm 4.8) e Paulo, realmente, discorre sobre a limitada importância que o exercício físico detém na vida humana.

Pelas palavras de Paulo, seria leviano dizer que o apóstolo não reconhece a importância da atividade física. Afinal, Paulo não diz que não há qualquer proveito na atividade física, mas que há “pouco” (do grego oligos). Enfim, Paulo apenas requalifica a importância que os exercícios físicos devem ter na vida dos cristãos. Afinal, como pudemos perceber pelas explicações dispostas neste artigo, os exercícios físicos são de pouco proveito para estenderem a longevidade, fama e glória sobremaneira.

O apóstolo Paulo explica, sucintamente, a piedade a que se refere nesse versículo: “Não há duvida de que é grande o mistério da piedade: Deus foi manifestado em corpo, justificado no Espírito, visto pelos anjos, pregado entre as nações, crido no mundo, recebido na glória” (1Tm 3.16).

Logo, o conceito de piedade tem seu sentido completo apenas entre os cristãos, pois toda a sequência acima é o fundamento do plano divino para salvação da humanidade pelo sacrifício vicário de Jesus Cristo. Um homem piedoso é aquele que crê nessa mensagem e se regozija nela.

Tão logo um ser humano se arrepende de seus pecados e crê em Cristo, deve ser exercitado na piedade que é, basicamente, viver como Cristo viveria: “Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gl 2.20).

O excelente exercício da piedade tem peso de glória eterna! É por essa razão que Paulo enfatiza que é uma promessa para a vida presente e para a futura. A vida presente está vinculada a essa promessa de vida eterna, pois se fundamenta na esperança do término da obra redentora de Cristo em nossas vidas, inclusive de nosso corpo corruptível que não consegue manter-se vivo por mais que façamos exercícios físicos: “Estou convencido de que aquele que começou boa obra em vocês vai completá-la até o dia de Cristo Jesus” (Fp 1.6).

Alguns anos a mais na expectativa de vida e efêmera honra e glória podem ser esperados dos esportes e de uma vida de intenso treinamento físico. Todavia, só a piedade (no sentido bíblico) pode nos proporcionar a vida e glória eternas! Como alcançá-la? Receba, pela fé, a Cristo, cuja verdade conduz a Deus e à vida piedosa: “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo para levar os eleitos de Deus à fé e ao conhecimento da verdade que conduz à piedade; fé e conhecimento que se fundamentam na esperança da vida eterna, a qual o Deus que não mente prometeu antes dos tempos eternos” (Tt 1.1,2).


Leandro Boer


Referências bibliográficas:

1. Sociedade Brasileira de Cardiologia/Sociedade Brasileira de Hipertensão/Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol 2010;95(1 Supl. 1):1-51.

2. Gajewski AK, Poznańska A. Mortality of top athletes, actors and clergy in Poland: 1924-2000 follow-up study of the long term effect of physical activity.Eur J Epidemiol. 2008;23(5):335-40.

3. Teramoto M, Bungum TJ. Mortality and longevity of elite athletes. J Sci Med Sport. 2010 Jul;13(4):410-6.

4. Bianco M, Fabbricatore C, Sanna N, Fabiano C, Palmieri V, Zeppilli P. Elite athletes: is survival shortened in boxers? Int J Sports Med. 2007 Aug;28(8):697-702.

Um comentário:

  1. CARO BOER,

    UMA EXPOSIÇÃO ESCLARECEDORA DOS VALORES EFEMERO X ETERNO.ESTATISTICA FUNDAMENTADA, PARABENS.
    COMO SUGESTÃO, SE HOUVER UM COMPLEMENTO DO ARTIGO,DEFINIR COM MAIOR PROFUNDIDADE PIEDADE, O QUE É? TEXTOS PARALELOS, CLAREANDO AINDA MAIS O ENTENDIMENTO E PERCEPÇÃO DE PIEDADE. FAVOR OBSERVA-SE % DE EXPOSIÇÃO DO EXERCICIO FISICO EM RELAÇÃO AO % DA PIEDADE
    REFORÇANDO QUE O CONHECIMENTO É ABRANGENTE, "conhecimento da verdade", ESTÁ INTIMAMENTE VINCULADO A SABEDORIA DE DEUS EM NOSSAS VIDAS, OU SEJA A PRATICA DO EXERCICIO DA TEOLOGIA BIBLICA VIVIDA LEVA A LONGEVIDADE.................................

    SAUDAÇÕES
    OTAVIO

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