terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Retrato do Ímpio

Acho incrível como os policiais são treinados para descreverem suspeitos e reconhecerem tais características nas pessoas. Enquanto certos indivíduos são maus fisionomistas, alguns homens da lei conseguem, ao olhar para uma pessoa, saber sua altura, peso, cor dos olhos e notar marcas como cicatrizes e tatuagens. Muitas vezes, a descrição física de um suspeito, para alguns policiais, equivale a um retrato. É uma qualidade admirável – e útil – que não compartilho com os agentes da segurança pública. Apesar de eu nunca me esquecer de um rosto, eu não sei descrever ninguém.

Ao que me parece, um dos salmistas soube fazer muito bem uma descrição. Na verdade, o escritor do Salmo 10 soube descrever o “perverso” tão bem que é como se tivéssemos um retrato dele.

O v.2 diz que o perverso age “com arrogância”, bega’awat, que também pode significar “com orgulho” ou “com majestade”. É o sentimento de quem se julga um tipo de rei. Para ele, seu valor pessoal supera o de todos ao redor. Ele deve ser servido e sua vontade atendida. Esse sentimento maligno, segundo o texto, o leva a perseguir o pobre, tramando contra ele. Nenhum sentimento de injustiça o dissuade de agir mal contra alguém, pois ele se acha no direito de fazer o que quiser.

Enquanto a cobiça é apontada pelas Escrituras como pecado e é vista com desprezo até pelo mundo, o perverso “se gloria da cobiça da sua alma” ou nos “desejos da sua alma” (v.3). A ideia de gloriar-se está expressa no verbo halal que, no grau em que se apresenta no texto, tem o sentido de “louvar, elogiar, exaltar”. É isso que o perverso faz: ele rende a si mesmo louvor e exaltação ao observar o “apetite da sua alma”, ta’awat naphshô. Apesar de essa expressão poder ter um sentido positivo, como em Isaías 26.8, o próprio v.3 dá pistas de quais são os “desejos” e “apetites” do perverso ao chamá-lo de “avarento”. Na verdade, o salmista usou um verbo para descrever a ação do perverso, botsea‘, que aponta para “aquele que arranca para si o lucro”. Nessa disposição, tal homem, diz o texto, “maldiz o Senhor”. Os anseios de tal homem são, portanto, diametralmente opostos ao desejo e ao caráter de Deus.

O fato de o perverso ser tão contrário a tudo que Deus é e ensina, não o preocupa. Na verdade, ele sequer se detém para avaliar sua vida. O v.4 diz que, por causa do seu orgulho, ele “não investiga” o fato de Deus não fazer parte de todas as suas cogitações. Darash é uma “busca” que o perverso não realiza. Afinal, que erros podem ser encontrados pelo soberbo em si mesmo? Confiado na sua perfeição e no seu valor que excede o valor dos outros, ele “desafia”, yaphyah, todos quantos se opõem a ele (v.5). Sua confiança de jamais ser abalado e de não ser alvo de nenhum mal, conforme o v.6, é algo que ele repete para si mesmo “em seu coração”, belibô. Seu mal, sua soberba e sua confiança enganosa são algo nutrido no seu íntimo. Tais sentimentos estão enraizados nele.

Não são apenas os atos do perverso que são maus. Aquilo que ele fala é “cheio” de maldade. Ele pronuncia “maldição”, ’alah, por meio da sua boca. Sua língua é suficiente para causar destruição em sofrimento. O v.7 nos diz que naquilo que o injusto profere há “mentira”, mirmah,“engano”, tok, “opressão”, ‘amal, e “maldade”, ’awen. Não há como minimizar o mal e a violência capazes de ser exercidos pela boca do ímpio. Sua língua deve ser mais temida que suas mãos.

Munido de tamanha maldade, o perverso olha para o desamparado e fica de “tocaia” (v.8), e prepara-lhe uma “emboscada” (v.9). Seu objetivo, segundo o v.8, é “exterminar os inocentes”, yaharog naqy, e, conforme o v.9,  “arrastar com sua rede”, bemoshkô berishtô. Como um predador esperando a vítima, diz o v.10, ele “se abaixa e fica encurvado”, wadakah yashoah, preparando, assim, um ataque mortal. Essas três expressões transmitem ideias de caça: um animal matando uma presa para devorá-la, um pescador puxando sua rede com o peixe desavisado e um leão se ocultando na savana para atacar de surpresa. São três modos contundentes de avisar-nos sobre o perigo que representam os perversos para aqueles que não são como eles.

Finalmente, o v.11 mostra que o perverso, como muitos criminosos e corruptos no nosso país, tem a certeza da sua impunidade. Quando olha para sua maldade e suas ações traiçoeiras, diz para si mesmo que “Deus se esqueceu”, shakah ’el, no sentido de não se importar com o que acontece. Para o perverso, não há um juiz superior que o possa punir pelo que faz simplesmente porque tal juiz não atua. Por isso, ele se convence de que seu mal Deus “não vê nunca”, bal-ra‘ah lanetzah. Tal convicção não vem apenas da arrogância, mas também do desprezo por Deus e pela sua justiça e santidade.

Esse é um retrato terrível de alguém com quem devemos nos preocupar. O homem perverso é um risco para os servos do Senhor. Aquele que despreza Deus e a sua salvação é inimigo dos que amam o Senhor Jesus, ainda que não lhe tenham feito nada de mal. Portanto, na convivência com eles e até na pregação do Evangelho a eles, o cristão deve manter cautela a fim de não ser ferido, seja por meio da oposição aberta, seja por meio do desvio velado em um contato mais íntimo com o ímpio. Muitos servos do Senhor têm sido perseguidos pelo ódio dos ímpios, enquanto outros têm se desviado da santidade por meio do “amor” dos incrédulos. As táticas para abater a presa são muitas.

Com o retrato do perverso em mãos, devemos ficar atentos como os policiais a fim de reconhecer o perigo e nos prevenir dos seus males. Afinal, depois de a casa ser roubada, pouco sobra para a polícia fazer.

Pr. Thomas Tronco

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Disposições Necessárias ao Cristão

Charles H. Spurgeon (1834-1892), conhecido como “o príncipe dos pregadores”, dirigiu uma famosa escola que treinava homens para o ministério cristão. Em uma de suas aulas, sobre o tema “pregação ao ar livre”, ele contou a história de um missionário na Irlanda, país de tradição religiosa romanista, chamado Gideon Ouseley (C.H. Spurgeon, Lições aos Meus Alunos, Vol.1, Fiel, 1990, pp. 80-83). Esse homem, sabiamente, costumava pregar diante de vidraças de farmácias e de casas de católicos para reprimir a fúria dos “atiradores” que, duvidosos de sua pontaria, evitariam lhe jogar tantas coisas.

Em uma de suas pregações, contou Spurgeon a seus alunos, Ouseley, de uma escadaria em frente ao mercado de Enniscorthy, começou a atrair ouvintes ao cantar um hino. A curiosidade promoveu um clima ameno entre os transeuntes até o final da oração do pregador. Entretanto, bastou iniciar a mensagem para que Gideon Ouseley fosse alvo, primeiro, de legumes velhos, batatas e nabos e, depois, de cacos de telha e pedras, os quais causaram alguns ferimentos leves.

Nesse momento, o pregador surpreendeu a multidão ao dizer que sua mensagem lhes seria agradável, pois era sobre a “bendita virgem”. A violência cessou e a atenção do público estava toda sobre o homem. Ele passou a narrar o casamento em Caná da Galiléia, quando a “virgem mãe” notificou o Salvador de que os noivos não tinham mais vinho e, voltando-se para um criado, conhecedora do coração e do caráter do filho, disse-lhe: “Faça tudo o que ele lhe disse” (Jo 2.5). A partir de então, Ouseley passou a citar frases de Jesus como “esforçai-vos por entrar pela porta estreita, pois eu vos digo que muitos procurarão entrar e não poderão” (Lc 13.24) e “quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus” (Jo 3.5), completando-as com a frase: “Faça tudo o que ele lhe disse”. Em dado momento, irrompeu, dentre a multidão, uma voz: "Você está certo, está certo".

Essa história me lembra duas disposições necessárias a todo cristão, exemplificadas nessa experiência de Gideon Ouseley:

1. O compromisso de pregar o Evangelho. O evangelismo é uma ordem (Mt 28.19; At 1.8) que deve ser cumprida pela Igreja de Cristo como vocação (1Pe 2.9) e com total empenho e desprendimento (2Tm 4.2). Mesmo quando é alto o custo de falar das boas-novas da salvação, o crente não deve se intimidar ao falar de Jesus (At 4.18-21; 2Tm 1.8), dependendo do auxílio e proteção de Deus (At 18.9-11).

2. O aprendizado e a memorização das Escrituras. Não é possível falar sobre aquilo que não se conhece. A habilidade de Ouseley, narrada acima, só foi possível porque ele conhecia bem a Bíblia e podia usá-la como uma ferramenta. Sem o conhecimento da Palavra de Deus, não é possível ensinar, exortar ou corrigir (2Tm 3.16,17). É preciso estar preparado para apresentar as razões na nossa fé (1Pe 3.15), embasando-a na sua fonte. Sem o conhecimento e a aplicação das Escrituras, não há, de fato, evangelismo (Rm 1.16).

Por um lado, é correto pensar que seria muito bom termos de volta Gideon Ouseley a fim de pregar o Evangelho com tanta ousadia, sabedoria e conhecimento da Palavra. Por outro, é irrelevante a presença ou a ausência de certos nomes, visto que à Igreja, como todo, foram dados tanto as Escrituras como o chamado e a capacitação para o evangelismo. Muitos gideons ouseleys podem e devem pregar hoje, inclusive dentre os da nossa igreja.

Temos de ter coragem, comprometimento e ousadia para falar de Jesus e conduzir a ele os perdidos. É certo que muitas vezes nos arremessarão pedras e cacos de telha, mas nos empenhamos na santa esperança de ouvir, no meio da turba, alguns que digam: "Você está certo, está certo".

Pr. Thomas Tronco
Soli Deo gloria

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A Quem Recorrer no Dia Mau?

Nessa semana, furei meu pé em uma haste de ferro que sustenta uma tenda de nylon instalada no gramado de casa. Depois de ensanguentar minha cozinha, sala, quarto e banheiro, procurei o hospital que atende meu convênio a fim de tomar uma vacina contra tétano. Ouvi, lá, da atendente, que eu deveria procurar tal medicamento na rede pública de saúde. Dirigi-me para a um hospital público e aguardei um bom tempo até ser chamado junto com outras quatro pessoas. Para minha surpresa, os cinco pacientes foram atendidos em apenas 3 minutos. Minha consulta não demorou mais do que o tempo de eu contar para o médico que havia perfurado meu pé em um ferro, ele me perguntar se era o pé direito ou esquerdo – não sei para quê – e, sem nem sequer olhar o ferimento, me receitar duas injeções, a vacina e um antibiótico de largo espectro. Para ser bem sincero, me senti completamente desamparado e sem ter a quem recorrer que pudesse me dar conforto e segurança.

Nesse sentido, toda vez que leio a história da mulher usada por Joabe a fim de fazer Davi receber Absalão de volta em Jerusalém (2Sm 14.1-24), fico abismado com um aspecto em particular: uma mulher desconhecida conseguiu facilmente uma audiência com o rei. Que diferença da realidade atual! Multidões, por vezes, aguardam horas e horas, debaixo de Sol e chuva, para ver de longe uma autoridade famosa como presidentes, reis e primeiros-ministros. Falar pessoalmente com eles? Impossível! Encontrar neles compaixão? Só se outros milhares estiverem sob as mesmas circunstâncias e se a solução do problema tiver repercussão na mídia. Ver tais líderes tomarem decisões justas? A justiça, muitas vezes, é interpretada conforme os interesses dos poderosos.

Concordo que não é uma visão animadora, nem o que nos espera, muito promissor. Entretanto, não perco as esperanças quanto ao futuro, pois me lembro que, após os desmandos dos governantes humanos, haverá quem governe de modo especial. O Salmo 9, cântico no qual o rei Davi louva a Deus por livrá-lo dos inimigos maus e roga que o livra da fúria deles, traz alguns aspectos da função do Senhor como governante.

Em primeiro lugar, ele julga com retidão inabalável. Davi diz que Deus “permanece no seu trono eternamente, trono que erigiu para julgar. Ele mesmo julga o mundo com justiça;” (vv.7,8a). A segunda parte do v.7 diz que Deus “se assentou no trono para o julgamento” (tradução literal). Entretanto, o início do versículo demonstra que essa não é uma realidade momentânea ou dependente das circunstâncias ou dos humores. Trata-se de uma disposição permanente de Deus, pois, para julgar, ele se assenta “eternamente”, le`olam. Nada pode demovê-lo desse intento ou retirá-lo desse trono. Ele é um justo juiz todo o tempo e para sempre.

Em segundo lugar, ele governa soberanamente as nações. O salmista afirma que o Senhor “administra os povos com retidão” (v.8b). O verbo dyn significa, em sentido restrito, “julgar”, o que condiz com a figura do juiz apresentado no início da frase. Mas, em sentido amplo, significa “reinar, governar”. Dado o caráter judicial dos reis da época, os atos de julgar e de reinar vinham da mesma fonte. Por isso, o texto revela que Deus, não apenas pune os maus, mas “dirige” as pessoas. Seu poder faz valer suas decisões. Com Deus não existe aquela máxima tão triste de quem depende da justiça humana: “Ganhou, mas não levou”. A soberania do Senhor se faz sentir quando ele traz uma questão a julgamento.

Em terceiro, ele alivia os oprimidos. O texto diz que Deus é “alto refúgio para o oprimido, refúgio nas horas de tribulação” (v.9). A ausência de justiça por parte dos homens sempre trouxe sofrimento aos fracos. O próprio Deus acusou os israelitas, certa vez, de não promoverem a justiça que ele ordenou: “Este [o Senhor] desejou que exercessem juízo, e eis aí quebrantamento da lei; justiça, e eis aí clamor” (Is 5.7). A injustiça de uns é o clamor de outros. Para ambos, Deus tem um tipo de tratamento: juízo para os injustos e alívio para os que clamam. Ele é um “refúgio”, diz o v.9, nas “horas de fome ou de seca”, le`ittot batzarah, o que, figuradamente, lembra da opressão e da necessidade que passa quem procura a justiça e não a encontra.

Em quarto lugar, ele é acessível aos que o buscam. Davi também diz: “Em ti, pois, confiam os que conhecem o teu nome, porque tu, Senhor, não desamparas os que te buscam” (v.10). Com uma atitude justa e inabalável, é óbvio que Deus é o alvo da confiança dos que dele necessitam e que nele buscam amparo. Contudo, algo notável surge de uma observação atenta do texto. Davi nos conta quem tem esses benefícios por parte de Deus. Diferente do mundo, onde quem é beneficiado são os poderosos em influentes em detrimento dos fracos, o alvo da benevolência e do julgamento reto do Senhor são os que o “buscam”. Enquanto, em Israel, muitas vezes a situação era de príncipes que vendiam sentenças contra os pobres que buscavam seus direitos, com Deus, aqueles que buscam nele amparo, de fato o encontram. O verbo darash reflete a atitude de um servo que, reconhecendo em outro o poder, a capacidade e a justiça, busca-o para sanar seu anseio.

Essa visão é reconfortante para o cristão quando percebe que não há, entre os homens, a quem recorrer. O Senhor é completamente diferente. Ele ama a justiça, odeia o pecado, ama os que o buscam e efetua, poderosamente, a sua vontade. E o melhor de tudo: quando Deus age, nunca é necessário recorrer a outra instância. Com Deus assentado em seu trono, não há comissão de ética, nem tribunal de apelação. Busque-o e recorra a ele!

Pr. Thomas Tronco

Deixar de Viver nas Alturas para Viver no Céu

“Pai, quero que os que me deste estejam comigo onde eu estou e vejam a minha glória, a glória que me deste porque me amaste antes da criação do mundo” (Jo 17.24).

O céu está em alta! Nunca se construiu tantos “arranha-céus” como nos últimos 20 anos. Recentemente, em 2009, foi inaugurado o Burj Khalifa, em Dubai, com 162 andares e 828 metros de altura (5 vezes maior que o Edifício Itália em São Paulo). Uma proeza que deixaria os engenheiros da torre de Babel atônitos!

O céu, também conhecido como “espaço sideral”, igualmente está em alta! Coincidentemente, em 2009, comemorou-se o “ano da astronomia” devido ao aniversário de 400 anos das observações astronômicas do italiano Galileu Galilei. Os cinco maiores telescópios entraram em ação nos últimos 20 anos: Hubble Space Telescope (1990), Keck Observatory (1993), Spitzer Space Telescope (2003), Large Binocular Telescope (2005), Fermi Gamma-Ray Space Telescope (2008) e o atual Giant Magellan Telescope.

Entretanto, existe um tipo de céu que está em baixa: o céu que é a prometida morada eterna dos crentes. “Conheço um homem em Cristo que há catorze anos foi arrebatado ao terceiro céu. Se foi no corpo ou fora do corpo, não sei; Deus o sabe” (2Co 12.2). Este é o céu que o apóstolo Paulo define como “terceiro céu”, não porque haja “castas celestiais” (como os gnósticos criam nos tempos de Paulo), mas sim porque os judeus faziam uma clara distinção entre o céu criado e o céu do Criador.

Em suma, o primeiro céu é a troposfera, a porção mais baixa da atmosfera com 10 km de extensão, onde voam os pássaros. Esse céu, abordado no primeiro parágrafo, não é negligenciado. Tampouco está esquecido o “segundo céu”, igualmente uma espetacular criação de Deus, a saber, o céu das estrelas. Haja vista os atuais telescópios em funcionamento e os que entrarão em operação nos próximos anos, o céu (espaço sideral) continua deixando o Homem maravilhado.

Entretanto, o fato de o “terceiro” e mais importante céu estar em baixa não deve deixar os crentes surpresos. Afinal, espera-se mesmo que a incredulidade leve os homens a se extasiarem (até o ponto de adorarem corpos celestes) dos céus da criação: “Trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram a coisas e seres criados, em lugar do Criador, que é bendito para sempre. Amém” (Rm 1.25).

O que é inadmissível é a perda do interesse dos crentes - os eleitos de Deus - pelo céu do Criador. Não é difícil perceber que o descaso com o céu envenenou o meio evangélico. O céu desapareceu dos púlpitos brasileiros e, também, dos nossos cânticos e hinos. O meio evangélico deixou-se levar pela inclinação carnal da gratificação imediata e do pensamento auto-indulgente. A consequência é que as pregações sobre o céu “foram para o espaço”!

E por que os crentes devem parar de “orbitar” ao redor das coisas terrenas e vislumbrarem o céu do Criador? Pelo simples fato de que ou um crente está no céu ou está indo para lá. Qualquer outra opção estranha a esses desfechos pertence à incredulidade e ao inferno.

E por que deveríamos almejar tanto o céu? O apóstolo Paulo afirma que é impossível que um crente genuíno reprima sua aspiração pelo céu, pois ela é o alívio de sua angústia terrena, como uma pessoa despida busca, ardentemente, por sua vestimenta: “Pois, enquanto estamos nesta casa, gememos e nos angustiamos, porque não queremos ser despidos, mas revestidos da nossa habitação celestial, para que aquilo que é mortal seja absorvido pela vida” (2Co 5.4).

O meio evangélico busca, ardentemente, revestir-se do quê? Se o pensamento auto-indulgente estiver arraigado nos corações, as pessoas buscarão, efusivamente, não o céu, mas o shopping center para revestirem-se “da cabeça aos pés” de tudo o que a concupiscência dos olhos puder oferecer.

Mas o que é a Palavra de Deus tem nos dizer sobre o céu? Para se entender o que é o céu do Criador, deve-se notar que a palavra “céu” aparece 550 vezes em toda a Bíblia. E essas palavras não têm o mesmo significado. Algumas vezes elas se referem à atmosfera do planeta (“primeiro céu”), em outras ocasiões ao espaço sideral (“segundo céu”), em outras passagens surgem como metonímias do próprio Deus e, esperançosamente, várias vezes aparecem, pelos lábios de nosso próprio Senhor Jesus Cristo, como o lugar que ele quer habitar conosco (“terceiro céu”): “Na casa de meu pai há muitos aposentos; se não fosse assim, eu lhes teria dito. Vou preparar-lhes lugar. [...] Pai, quero que os que me deste estejam comigo onde eu estou e vejam a minha glória, a glória que me deste porque me amaste antes da criação do mundo” (Jo 14.2; 17.24).

O que o céu não é, definitivamente, é um “estado de espírito”, “uma atitude de vida” ou "uma ótica diferente sobre as coisas terrenas”, comumente ditas pelo mundo. O céu é um lugar! E um lugar muitíssimo especial o qual devemos ansiar ardentemente. Ademais, é a promessa de um lugar que tem a propriedade de confortar e fortalecer o coração dos nossos irmãos nos mais excruciantes problemas: “E assim estaremos com o Senhor para sempre. Consolem-se uns aos outros essas palavras” (1Ts 4.17b-18); “Sejam também pacientes e fortaleçam o seu coração, pois a vinda do Senhor está próxima” (Tg 5.8).

Será que o meio evangélico auto-indulgente e “físico” (materialista), enganado pela teologia da prosperidade, aceitaria um consolo tão “metafísico” assim? Não estranhe se o aflito “mandar o seu consolo para o espaço”, dizendo: “Estou passando por vários problemas difíceis e você vem agora falar para mim sobre o céu?!”

Lembremo-nos de alguns aspectos que nos motivam a desejar esse maravilhoso lugar, o céu:

1. O seu Deus está lá: “Vocês orem assim: Pai nosso, que estás nos céus! Santificado seja o teu nome” (Mt 6.9).

2. O seu Salvador está lá: “Pois Cristo não entrou em santuário feito por homens, uma simples representação do verdadeiro; ele entrou nos céus, para agora se apresentar diante de Deus em nosso favor (Hb 9.24).

3. Os seus irmãos estão lá: “À igreja dos primogênitos, cujos nomes estão escritos nos céus. Vocês chegaram a Deus, juiz de todos os homens, aos espíritos dos justos aperfeiçoados” (Hb 12.22).

4. O seu nome está registrado lá: “Contudo, alegrem-se, não porque os espíritos se submetem a vocês, mas porque seus nomes estão escritos nos céus” (Lc 10.20).

5. A sua cidadania está lá: “A nossa cidadania, porém, está nos céus, de onde esperamos ansiosamente o Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Fp 3.20).

6. A sua recompensa está lá: “Alegrem-se e regozijem-se porque grande é a sua recompensa nos céus, pois da mesma forma perseguiram os profetas que viveram antes de vocês” (Mt 5.12).

7. O seu tesouro está lá: “Não acumulem para vocês tesouras na terra, onde a traça e a ferrugem destroem, e onde os ladrões arrombam e furtam. Mas acumulem para vocês tesouros nos céus, onde a traça e a ferrugem não destroem, e onde os ladrões não arrombam nem furtam” (Mt 6.19-20).

8. O seu justo protetor está lá: “Vocês, senhores, tratem seus escravos da mesma forma. Não os ameacem, uma vez que vocês sabem que o Senhor deles e de vocês está nos céus, e ele não faz diferença entre as pessoas” (Ef 6.7).

Crente, você não é daqui! Se um dia alguém do mundo o insultar dizendo que “você não é deste mundo”, ele não está o insultando, mas relembrando os pontos supracitados! Aliás, graças a Deus não somos deste mundo!

Entretanto, ainda estamos aqui. Mas, desde já, provamos uma alegria que reside nas bênçãos que recebemos de nosso Pai durante a peregrinação nesse mundo. Nosso Deus nos ajuda a manejar o “passaporte celestial” e recebemos, já nesta vida, conforto, amizade, comunhão e alegria. Apesar disso, nossos melhores dias como igreja não se compararão ao gozo reservado aos santos no céu por toda a eternidade: “Paulo, apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus, aos santos e fiéis em Cristo Jesus que estão em Éfeso: a vocês, graça e paz da parte de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo. Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nas regiões celestiais em Cristo” (Ef 1.1-3).

Crente, regozije-se no Senhor e releia o trecho acima substituindo a palavra “Éfeso” pelo nome da cidade em que você vive.

Até o céu!

Leandro Boer

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Como Evangelizar Evangélicos

Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor, Senhor, não profetizamos em teu nome? Em teu nome não expulsamos demônios e não realizamos muitos milagres?’ Então eu lhes direi claramente: Nunca os conheci. Afastem-se de mim vocês, que praticam o mal! (Mt 7.22-23)

O meio evangélico é um dos campos missionários mais vastos do nosso país. Alguém duvida? Então fique atento ao modo de pensar e viver dos milhões de “crentes” que andam por aí e ficará surpreso. A maior parte dessa gente não demonstra nenhuma transformação de caráter, nenhuma alteração em seus valores, nenhum compromisso com a santificação e nenhum grau de discernimento espiritual. Parece que a estratégia principal do diabo para destruir a obra de Deus nas últimas décadas deixou de ser debilitar igrejas verdadeiras com os atrativos da apostasia. Agora, ele cria igrejas falsas compostas por cadáveres espirituais apodrecidos com o objetivo de emporcalhar o santo nome de cristão diante do mundo.

Esse método tem dado certo. Com efeito, não é difícil encontrar “crentes” de todos os tipos. Há evangélicos que formam blocos de carnaval, mulheres “cristãs” que falam e se comportam como prostitutas desavergonhadas. Há ainda “pastores” gays casados entre si e missionários e evangelistas hábeis na “arte” do estelionato, além de uma massa enorme de gente de péssima qualidade moral que, às vezes, sai em passeata pela rua gritando o nome de Jesus com a mesma boca com que fala palavrões.

Isso mostra que, de fato, o meio evangélico é um vasto campo missionário. Crentes de verdade, pessoas que conheceram o real poder do evangelho de Cristo, devem testemunhar a esse povo acerca da graça salvadora de Deus, evitando acreditar na piada de que eles são irmãos na fé que precisam apenas de algumas correções. Não. O problema básico da maioria dos neo-evangélicos não é falta de doutrina, mas sim falta de novo nascimento, sendo dever do cristão genuíno apresentar-lhes o evangelho da cruz.

Como isso pode ser feito de forma inteligente, sem deixar que a discussão se perca em meio a opiniões religiosas sem importância? Bom, não acredito em métodos infalíveis do tipo “Doze passos para ganhar um evangélico para Cristo”. Como pastor reformado, penso que só o convencimento do Espírito Santo pode conduzir alguém aos pés da cruz. Creio, contudo, que no trato com crentes falsos, o mensageiro do Senhor pode evitar perder tempo com tolices se agir da forma descrita a seguir.

Primeiro, pergunte se o “irmão” é crente. Não se assuste. A reação dele vai ser mais ou menos assim: “É claro que sou! Eu já não lhe falei que faço parte da Comunidade Evangélica Fogo da Sarça – Sede Mundial?” É nesse ponto que você vai fazer a pergunta fatal. Diga-lhe mais ou menos o seguinte: “Ah, é verdade! Você havia dito... E como foi sua conversão?” Pronto. É aqui que tudo desaba. O neo-evangélico não sabe o que é conversão. Ele vai ficar confuso, vai perguntar o que você quis dizer com essa pergunta, vai contar como foi batizado, como Jesus curou a dor que ele tinha no braço, como o pastor profetizou que ele ia achar emprego, enfim, vai dizer uma tonelada de sandices.

Então você deverá responder: “Amigo, eu tenho certeza de que todos esses episódios foram importantes para você, mas eu perguntei outra coisa. Eu perguntei quando foi que você, após ouvir ou ler a Palavra de Deus, descobriu apavorado que era um pecador perdido, separado da glória de Deus e caminhando para a perdição eterna; quando foi que, ouvindo o Evangelho, você aprendeu que Cristo veio a este mundo como substituto perfeito, a fim de sofrer a punição pelo nosso pecado; quando você entendeu o sentido de sua morte e ressurreição e quando, enfim, com essas informações em mente, você se lançou humilhado aos pés da cruz, dizendo: “Senhor, concede-me os benefícios da tua obra redentora. Lava-me, purifica-me, perdoa-me, salva-me. Eu te recebo, pela fé, como Deus e Salvador.’ Quando foi que isso aconteceu em sua vida?”
Não estranhe. O “irmão” vai olhar para você como se estivesse diante de um ET falando mandarim. Tenha, então, compaixão dele e, pacientemente, passe a explicar-lhe todas as coisas que disse.

Bom, espero que essas “dicas” ajudem. Ainda mais considerando que temos evangélicos incrédulos por toda parte, “revelando” que há muito trabalho a fazer. Realmente temos de aceitar esse fato: o nosso quintal também está branco para a ceifa.

Pr. Marcos Granconato

Soli Deo gloria

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Uma Profunda Destruição

Quem nunca recebeu, por e-mail, aquelas mensagens que correm a Internet nos fazendo rir com “pérolas” da educação moderna? Recebi, certa vez, uma dessas mensagens que sempre me fazem rir quando as releio. Segundo quem enviou, trata-se de frases retiradas de uma redação, requisitada na prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2008, sobre o “aquecimento global”. Entre as pérolas há frases como estas: Vamos nos unir juntos de mãos dadas para salvar o planeta”; “Animais ficam sem comida e sem dormida por causa das queimadas”; “A Amazônia tem valor ambiental ilastimável”; “Os dismatamentos é a fonte de inlegalidade e distruição da froresta amazônia” (sic). Parece até piada...

Absurdos – e risadas – à parte, uma das frases me deixou pensativo: “A Amazônia está sofrendo um grande, enorme e profundíssimo desmatamento devastador, intenso e imperdoável”. Esse é um exemplo de redundância em grau máximo. Entretanto, ele reflete um pouco da realidade das nossas matas e da nossa fauna. Quando observamos o tamanho da destruição da natureza, essa frase, uma aberração para a língua portuguesa, não nos parece tão distante da verdade em termos da geografia e biologia. A destruição tem sido, sim, profunda, devastadora e intensa.

Isso é muito triste, principalmente quando nos recordamos da fonte da natureza. Ela não é produto do acaso; não é consequência de uma explosão; não é efeito colateral de um caos no Universo. Ela é obra das mãos criativas do Senhor. Um salmista escreveu: “Sede benditos do Senhor, que fez os céus e a terra” (Sl 115.15). Não obstante, o Criador de tudo colocou o homem à frente de tudo o que há na terra: “Os céus são os céus do Senhor, mas a terra, deu-a ele aos filhos dos homens” (Sl 115.16). O verbo “dar”, do hebraico natan, significa também “entregar” ou “consignar”. Assim, ainda que toda a terra pertença ao Senhor, ele cedeu aos homens o direito de usufruir dela e o dever de cuidar da propriedade divina.

Olhando para a relação entre Deus e homens e entre os homens e a natureza, o Salmo 8 tem coisas interessantes a nos dizer. Em primeiro lugar, o homem, diante de Deus, nada é. Davi, vendo a criação divina, olha para o homem e diz: “Quando contemplo os teus céus, obra dos teus dedos, e a lua e as estrelas que estabeleceste, que é o homem, que dele te lembres? E o filho do homem, que o visites?” (vv.3,4). Parece que Davi considerava a grandeza da criação de Deus como algo tão maravilhoso a ponto de nublar a própria existência do homem. Entretanto, de maneira surpreendente, Davi afirma, sobre a condição do homem: “Fizeste-o, no entanto, por um pouco, menor do que Deus e de glória e de honra o coroaste” (v.5). A conjunção adversativa wa (w^), traduzida aqui por “no entanto”, demonstra a distância entre a dignidade do homem como criatura e a dignidade conferida por Deus a ele. É a enorme distância entre o que deveríamos ser e o que somos.

Em lugar de sermos meras criaturas como o restante, fomos revestidos de dignidade e responsabilidade tal que nos separou do restante da criação. Quanto a ela, foi-nos dada a fim de termos “domínio”: “Deste-lhe domínio sobre as obras da tua mão e sob seus pés tudo lhe puseste: ovelhas e bois, todos, e também os animais do campo; as aves do céu, e os peixes do mar e tudo o que percorre as sendas dos mares” (vv.6-8). A palavra mashal não significa apenas “dominar”, mas “reger” e “reinar”. É possível que a tradução “domínio” nos faça imaginar o uso cruel e egoísta da natureza. Mas esse não é o caso. O homem não recebeu de Deus o direito de usar a natureza como bem entender, mas, sim, o dever de, como um rei, reger o que lhe foi posto como direito de usufruir e dever de zelar. E a história está cheia de bons reis que chegaram a abrir mão dos seus direitos e até do seu bem-estar pelo bem do seu reino. Esses foram consagrados como bons reis. Como dominantes da criação de Deus, temos o dever de cuidar do que pertence ao Senhor e que nos foi confiado.

Portanto, o desvio do comportamento humano no sentido de destruir a natureza, em lugar de conservá-la, se deve ao fato de ser pecador. Somente quando o homem é transformado da sua condição de pecador para a condição de filho da Luz é que, também, pode haver mudança nos seus atos em relação ao restante da criação de Deus. Assim, em última instância, não é do Green Peace ou do Sea Shepherd que precisamos a fim de proteger o planeta, mas de missionários e evangelistas comprometidos em causar transformação, por meio da pregação do Evangelho, nos corações dos pecadores. Desse modo, por meio da atuação do Espírito Santo, pode haver, de modo completo e abrangente, a formação de novos seres, cujas vidas darão frutos dignos das mais belas árvores criadas por Deus.

Pr. Thomas Tronco

O Melhor do Brasil é o Brasileiro?

Nove entre dez brasileiros gostam da frase “Eu sou brasileiro e não desisto nunca”. Esse é um dos resultados da campanha “O melhor do Brasil é o brasileiro”, realizada pelo Ibope para a Associação Brasileira de Anunciantes (ABA). Embora o slogan oficial do governo Lula seja “Brasil, país de todos”, o título desse artigo cativou sobremaneira o atual presidente da república ao ponto de obter apoio formal à campanha.

O marketing político tem muitas aplicações. Uma delas é a incumbência de criar bordões políticos que visem à captação da essência dos objetivos de um determinado governo eleito. Essa prática não é nova. Desde a proclamação da República pelo Marechal Deodoro da Fonseca, em 1889, bordões políticos têm sido instilados entre os brasileiros debaixo do bordão máximo de nosso pavilhão nacional “Ordem e Progresso”. Os seguintes bordões refletiram a tônica dos governos republicanos brasileiros: o início da república “café-com-leite”, nas mãos das oligarquias mineira e paulista, com a frase proferida por Joaquim Murtinho, ministro da Fazenda do governo de Campos Salles – “Nossa vocação é agrícola” (1898); pegando “carona” na explosão da produção mundial de carros, sob o governo de Washington Luís, com “Governar é abrir estradas” (1926); pelo aclamado “pai dos pobres”, Getúlio Vargas, com “O petróleo é nosso” (1953); pelos cinco pontos do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek com “50 anos em 5” (1956); pelo jingle da vassoura do breve presidente Jânio Quadros com “Varre, varre, vassourinha” (1960); pelos ditadores do “milagre econômico” e tricampeões da Copa do Mundo com “Ame-o ou deixe-o (1970); com o fim da ditadura militar no governo de José Sarney com “Tudo pelo social” (1985); com Itamar Franco homenageando o povo brasileiro pelo sucesso do impeachment de Fernando Collor com “Brasil, união de todos” (1993); sob a liderança de Fernando Henrique Cardoso, tendo a inflação sob controle, com “Avança, Brasil” (2001); e com o atual governo brasileiro, sobre os ombros do popular presidente Lula, com “O melhor do Brasil é o brasileiro” (2004).

Através dos tempos, percebe-se que houve mudanças nos bordões políticos. Todavia, há um traço comum a todos os bordões e seus respectivos objetivos: o humanismo secular.

O humanismo secular pode ser facilmente compreendido pelos três manifestos humanistas que surgiram no século 20, em 1933, 1973 e 2003. O tema central dos três manifestos é a elaboração de um sistema filosófico e de valores que não crê em uma deidade pessoal com poder soberano. Essa cosmovisão, que destrona a divindade e entroniza o próprio ser humano com a coroa da ciência e análise crítica, “garante”, aos seus súditos, a libertação da humanidade das brutalidades da mera sobrevivência, a redução do sofrimento, a diminuição das desigualdades de circunstâncias e competências e a justa distribuição dos recursos naturais e dos frutos do esforço humano para que tantos quanto possível possam gozar de uma boa vida. Que “promessa”!

Nesse sistema filosófico antropocêntrico, o ser humano é senhor de seu próprio destino, dono de seu próprio caminho. Talvez, a canção My way, que se tornou famosa na voz de Frank Sinatra (1968), seja uma espécie de hino do antropocentrismo: “Eu vivi uma vida que foi cheia/Eu viajei por cada e todas as rodovias/E mais, muito mais que isso/Eu fiz do meu jeito/Arrependimentos, eu tive alguns/Mas então, de novo, tão poucos para mencionar/Eu fiz, o que eu tinha que fazer/E eu vi tudo, sem exceção” (I´ve lived a life that´s full/I traveled each and every highway/And more, much more than this/I did it my way/Regrets, I´ve had a few/But then again, too few to mention/I did what I had to do/And saw it through without exemption).

Mas, o que a Palavra de Deus tem a dizer, ou melhor, a condenar sobre tudo isso? O humanismo falhou tremendamente em promover a justiça e equidade prometida semelhantemente aos governos que vêm se apoiando nesse sistema filosófico, pois “há caminho que parece certo ao homem, mas no final conduz à morte” (Pv 14.12). É importante ressaltar que seguir o my way não é uma conduta atual, pois, “no passado ele [Deus] permitiu que todas as nações seguissem os seus próprios caminhos” (At 14.16). O resultado sempre foi rebelião contra Deus e, como prometido, o castigo terreno e o do porvir. Ademais, o progresso tecnológico, nunca antes visto na história, que deveria promover uma sociedade melhor, apenas maximizou o pecado da cobiça e tornou mais nítido o “ter” das classes sociais, pois o ser humano, porque é ironicamente “humano”, está contaminado: “Pois do coração saem os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios, as imoralidades sexuais, os roubos, os falsos testemunhos e as calúnias” (Mt 15.19).

Vejamos, agora, a estatística que abriu este artigo por outro ângulo: um em cada dez brasileiros não gosta da frase “Eu sou brasileiro e não desisto nunca”. Será que essa pessoa, ao invés de determinar o seu autossenhorio – ou, como gostam de classificar os intelectuais humanistas, o self-made men (“homem que se fez/homem que se construiu/homem que determinou o seu destino”) – adotaria como slogan de sua vida o versículo “Eu sei, Senhor, que não está nas mãos do homem o seu futuro; não compete ao homem dirigir os seus passos” (Jr 10.23)?

Seria essa exceção uma pessoa que submete a Deus sua vida e tudo que nela há? “Reconheça o Senhor em todos os seus caminhos, e ele endireitará as suas veredas” (Pv 3.6). Seria essa exceção uma pessoa que crê nas promessas dessa sujeição como “O senhor firma os passos de um homem, quando a conduta deste o agrada [...] Ele traz no coração a lei do seu Deus; nunca pisará em falso” (Sl 37.23,31)?  Seria essa exceção uma pessoa que diz “Eu sou cristão e, pela graça de Deus, não desistirei nunca”?

Você está cansado das promessas não cumpridas dos seres humanos? Se não, não lhe faltarão oportunidades para se embriagar nelas. A Palavra de Deus o adverte e revela a solução: “Deus não é homem para que minta, nem filho de homem para que se arrependa. Acaso ele fala, e deixa de agir? Acaso promete, e deixa de cumprir?” (Nm 23.19).

Milhares de promessas de Deus já foram cumpridas. Outras já são uma realidade em sua vida. Mas, de qual promessa você faz parte? “Por que Deus amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, mas para que este fosse salvo por meio dele. Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado,  por não crer no nome do Filho Unigênito de Deus(Jo 3.16-18).

Leandro Boer

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Micropolítica

"Ele deve governar bem sua própria família... Pois, se alguém não sabe governar sua própria família, como poderá cuidar da igreja de Deus?"  (1Tm 3.4-5).

Não entendo de política, mas, com o tempo, assimilei um “princípio” que parece inegável: os candidatos, quando eleitos, sempre decepcionam. Partidos, personagens e propostas encantam as pessoas durante algum tempo e enchem o coração delas de esperança com belas promessas de um futuro melhor. Bem cedo, porém, todos se sentem enganados, voltando então os olhos para outros partidos e outros candidatos que, uma vez no poder, novamente decepcionam o povo.

Nos últimos tempos a coisa piorou. Com as eleições que se aproximam, os desiludidos como eu não se preocupam só com decepções. Temos medo de outros males. Temos medo de ver nossa liberdade ameaçada; temos medo de ver a criminalização da decência; temos medo de ver a perpetuação de um império de injustiças. Sim, pois as pessoas e partidos que dominam o País trabalham abertamente em prol da banalização do casamento e da família, defendem perversões sexuais, militam em prol do aborto e preparam o terreno para cercear a liberdade religiosa de que desfrutamos. Alguns dizem que o nosso presidente apoia tudo isso, que ele é amigo de ditadores assassinos e que vive associado ao lixo da política internacional.

Nesse cenário, votar deixou de ser um gesto político fadado a gerar meras decepções. Votar, agora, é um ato perigoso. Pode representar um ataque contra a fé e contra os princípios cristãos fundamentais. Sim, para o crente, votar pode ser um ato suicida, um meio de alimentar o monstro que mais tarde não medirá esforços para destruir a igreja e sua mensagem.

Tudo isso assusta e nos deixa ansiosos. Qual seria a saída para a expectativa de desilusões e prejuízos que a política invariavelmente traz? Como amenizar, enquanto o Príncipe da Paz não vem, a angústia que se aloja em nosso peito quando vemos desabar, sob os golpes dos poderosos, aqueles valores que tanto amamos?

É claro que a principal saída é manter acesa a chama de esperança no estabelecimento do Novo Céu e da Nova Terra que o Senhor criará para os seus eleitos. Porém, essa esperança não pode ser (e não é!) do tipo que lança os cristãos na inércia. C. S. Lewis estava certo quando disse que os homens que mais trabalharam em prol deste mundo foram exatamente os que mais ansiaram pelo outro! De fato, a esperança cristã é atuante. Ela não fica somente a repetir “Venha o teu Reino!”. Antes, leva o homem a viver como se o Reino já estivesse estabelecido plenamente aqui.

Isso é possível porque todos nós detemos algum grau de poder. Todos nós reinamos sobre alguma coisa. Todos somos presidentes em alguma esfera, por menor que ela seja. Exercemos funções de autoridade dentro de casa, no trabalho, na igreja e na escola. Governamos (bem ou mal) nosso dinheiro, nosso corpo e nossas palavras. Administramos nosso tempo, nossos bens e nossos relacionamentos. Criamos leis e “programas de governo” com prioridades que dão rumo à nossa vida e trazem impacto sobre os outros. Com efeito, não há ninguém neste mundo a quem não tenha sido dada alguma parcela de poder. E mais: não há ninguém neste mundo que, na administração do poder que lhe foi dado, não afete, de forma boa ou má, as pessoas ao seu redor.

É essa visão de responsabilidade micropolítica que o crente deve compreender e adotar. Se ele anseia por vislumbrar já neste mundo um governo onde impere a justiça, a verdade, a decência, a ordem, a honestidade, a honra e os bons costumes, então, que construa, ele próprio, tudo isso no reino-célula que governa. Assim, dentro das fronteiras da sua casa, dos seus negócios, das suas palavras e das suas amizades, a esperança que nunca se concretiza por meio das urnas finalmente se realizará. Que o crente faça, portanto, boa micropolítica, governando sob o temor do Senhor. Se agir assim, com certeza vai dizer: “Nunca, na história desse micropaís, a gente se sentiu tão contente!”

Pr. Marcos Granconato
Soli Deo gloria

A Necessidade de um Juiz Reto

Ultimamente, as coisas estão do avesso. Bandidos andam impunemente pelas ruas, enquanto cidadãos de bem ficam presos em suas casas. Pessoas de bem são ameaçadas por quem as deveria proteger. Homens honestos são roubados por pessoas que deveriam garantir a justiça, principalmente aos mais fracos.

Quando isso acontece, mesmo desacreditados a respeito da eficácia do sistema, as pessoas que foram injustiçadas procuram os responsáveis por garantir que a retidão e os direitos dos cidadãos sejam cumpridos. Mas, é aí que começa uma parte triste da história de muita gente. A justiça, que se espera vir de órgãos criados para esse fim, às vezes não chega, seja por corporativismo, corrupção ou por desigualdade de condições financeiras entre as partes, seja por meio da morosidade e da burocracia presentes nos veículos da justiça.

Tenho de ser honesto: é uma visão desalentadora. Confesso que não acredito mais na justiça promovida pelos homens, apesar de saber que há uma parcela de pessoas comprometida com a verdade e com a honestidade.

No meio da minha desilusão, vêm-me à mente o Salmo 7. Ele foi escrito após Davi ser acusado injustamente por alguém chamado Cuxe. Alguns comentaristas acreditam se tratar de alguém desconhecido, enquanto outros arriscam ser ele Simei (2Sm 16.5-13), ou o próprio Saul, cujo pai se chamava Quis (1Sm 9.1,2). Independente de quem seja, o fato de ser “benjamita” nos dá, como pano de fundo, a inimizade injustificada de Saul por Davi e as diversas tentativas de assassinato por parte do rei contra o jovem que, tudo que fez, foi servir ao Senhor e a Israel com fidelidade. Seja Cuxe quem for, ele estava alinhado com a desmoralização e perseguição de Davi com base em interesses escusos.

Diante dessa situação, sem se perder no desespero e na lamúria, Davi olha para o Senhor e diz: “Em ti me refugio” (v.1). Davi usa o mesmo verbo, hasah, que usou no Salmo 36.7 para dizer que “os filhos dos homens se acolhem à sombra das tuas asas”. Traz a ideia de alguém indefeso, como um filhotinho de ave, buscando abrigo e consolo sob as asas da sua grande e decidida mãe. Afinal, quem nunca viu uma galinha enfrentando quem quer que seja para proteger seus pequeninos? Era assim, e com essa confiança, que Davi olhava para Deus. Isso justifica o pedido de Davi: “Salva-me de todos os que me perseguem e livra-me, para que ninguém, como leão, me arrebate, despedaçando-me, não havendo quem me livre” (vv.1,2).

Essa esperança, contudo, não se baseava apenas em um tipo de otimismo ou em expectativas infundadas. Davi, que sabia qual era o tipo de poder que Deus possui, também conhecia a retidão dos seus juízos. Se Davi sofria injustiça diante de Cuxe e de outros benjamitas, o Senhor saberia julgar corretamente a situação e dar “ganho de causa” a quem de direito. Davi diz a Deus: “Se eu fiz o de que me culpam, se nas minhas mãos há iniqüidade, se paguei com o mal a quem estava em paz comigo, eu, que poupei aquele que sem razão me oprimia, persiga o inimigo a minha alma e alcance-a, espezinhe no chão a minha vida e arraste no pó a minha glória” (vv.3-5). Ao apresentar seu caso a Deus, Davi afirma sua retidão diante das falsas acusações e da perseguição e lembra seus atos justos, como, provavelmente, o de poupar Saul quando teve chance de matá-lo. O motivo para isso é que ele sabia que Deus conhecia tais fatos e saberia agir com sabedoria e retidão para com ele. Assim, recorrendo ao Senhor de toda justiça, Davi pede “desperta-te em meu favor” (v.6).

Com o rumo que as coisas têm tomado em nosso país e no mundo, principalmente no que tange à perseguição contra o cristianismo verdadeiro, é bem possível que a mesma oração de Davi deva ser feita por nós. Mas, se e quando o fizermos, que seja com a mesma atitude, em primeiro lugar confiante e, em segundo, com as mãos limpas de quem segue as palavras do Mestre.

Sendo assim, descansemos. Afinal, se uma pequena galinha pode dar conforto e proteção aos seus filhinhos, o que poderá o Senhor eterno, Rei dos reis, fazer por nós, seus filhos por quem enviou e entregou à morte o Senhor Jesus Cristo?

Pr. Thomas Tronco

sábado, 4 de setembro de 2010

'Mensagens Subliminares' em Desenhos Animados: Motivo de Preocupação para as Famílias Cristãs?

Deixar crianças assistir a desenhos animados, como os produzidos pela Walt Disney Pictures, pode persuadi-las a adotar comportamentos imorais ou até mesmo a tornar-se “adoradoras de Satanás” no futuro? Infelizmente, não faltarão pessoas para dizer que sim, principalmente no “oráculo pós-moderno” chamado Google.

Mas o que é, afinal, uma mensagem subliminar? Segundo a definição da literatura científica, a mensagem subliminar, que pode se apresentar em forma de palavra grafada ou verbal, ou em imagem, é qualquer informação que, após ser exposta ao ser humano, é captada pela mente sem atingir o limiar da consciência, ou seja, é percebida subconscientemente[1]. Um exemplo clássico foi a inserção de quadros com informações como "drink Coca-Cola" (beba Coca-Cola) em meio a uma sequência de filme em alta velocidade de quadros por segundo à projeção inferindo-se que a audiência captaria a mensagem sem conscientizar-se de que a leu. A hipótese levantada foi que, mesmo não tendo consciência do que se leu, a pessoa teria propensão a obedecer a mensagem. Os resultados, que deixaram a sociedade da década de 1950 perplexa, foram posteriormente desmentidos pelo próprio idealizador do projeto, James Vicary, que confessou tê-los fraudado[2]. Não é estranho imaginar que tal ideia pode deixar as pessoas temerosas, ansiosas ou até mesmo desesperadas. Também é notável como muitas ideias conhecidas como “teorias da conspiração” se aproveitam das mensagens subliminares com a finalidade de escravizar a sociedade pelo medo.

A grande preocupação que algumas pessoas têm - entre elas muitos cristãos - é que tais mensagens não só podem ser percebidas por suas crianças, mas as persuadem a simpatizar com símbolos e doutrinas satânicas. Será verdade?

Postula-se que mensagens subliminares podem ser percebidas pela mente humana, mas a informação não tem a propriedade de persuadí-la, em adultos saudáveis com estrutura psíquica devidamente estabelecida[1].

Mas, e quanto às crianças na mais tenra idade que ainda não têm sua estrutura psíquica devidamente estabelecida? Seria esse grupo vulnerável aos algozes das famigeradas teorias da conspiração? Seguramente, o que se pode dizer é que uma criança abandonada à intensa e sedutora programação infantil da mídia terá maior risco de tornar-se... obesa e sendentária[3]! Essa conclusão pode ser facilmente intuída ao se observar que as crianças trocaram suas atividades lúdicas aeróbicas, ou até mesmo intelectuais, como jogos de tabuleiro, por uma poltrona confortável, uma tela com desenhos animados e pacotes de biscoitos recheados.

Nota-se, curiosamente, em crianças que estão expostas a desenhos animados em programações infantis, um fenômeno justamente contrário ao que se ventila na internet: os desenhos animados promovem melhores atitudes raciais[4]. Enfim, as crianças tendem, além de aumentar seu conhecimento e imaginação, a aceitar amizades de diferentes etnias com maior facilidade comparativamente às crianças não expostas aos desenhos. Isso ocorre devido aos desenhos frequentemente enfatizarem a amizade na diversidade: e.g. vários tipos de animais que são amigos em uma floresta e que se unem contra um inimigo comum.

Entretanto, como ficariam os “preocupantes” desenhos “demonizantes” da Walt Disney Pictures? Uma pesquisa do Departamento de Psicologia da University of Calgary (Canadá) avaliou 34 filmes animados produzidos entre 1937 e 2001, bem como 41 desenhos animados da programação normal canadense (região de Calgary – Ontário). Em relação aos desenhos Disney, observou-se que 74% deles continham referências verbais “demonizantes” com média de 5,6 ocorrências por filme. Também se observou o número de personagens “demonizantes”: 34 (18%) dos 136 personagens principais eram “demonizados”, sem haver distinção na proporção de personagens “maus” do sexo masculino e feminino[5]. É importante ressaltar que essas informações sequer eram “subliminares”; eram, de fato, “liminares” à consciência, percebidas por qualquer um que assiste aos vídeos. E qual foi a conclusão dos autores?

Mais uma vez, a conclusão foi contrária ao que se esperava: as crianças não tendem à simpatia por personagens “demonizados”, mas adotam os personagens como referências do que é “mau” em suas vidas por meio de epítetos[5]. Enfim, a preocupação reside no fato de que as crianças, ao verem, por exemplo, uma vizinha idosa que maltrata crianças na rua, julgariam a ocorrência e diriam: “Papai, aquela vizinha deve ser uma ‘bruxa malvada’! Eu não gosto dela!”.

Dessa forma, pode-se concluir que não há perigo de uma criança tornar-se “adoradora de Satanás” assistindo a desenhos animados da Disney? Aí está a verdadeira armadilha de Satanás! E, para desarmá-la, a ciência é ineficaz, pois apenas a (suficiente) Palavra de Deus pode nos ajudar a corrigir o nosso próprio caminho e os das crianças, além de nos resguardar das ciladas do “pai da mentira”. O problema reside na negligência com o conhecimento bíblico a respeito dos seguintes temas:

a) A criança é pecadora e, como todo pecador, a sua carne a inclinará naturalmente para o pecado, com ou sem a atuação de Satanás: “Sei que sou pecador desde que nasci, sim, desde que me concebeu minha mãe” (Sl 51.5);

b) A criança, por já nescer pecadora e, portanto, incrédula, não corre o risco de se tornar uma “adoradora de Satanás”, pois já é uma “filha da desobediência” (um eufemismo de “adorador de Satanás”), assim como todos nós, cristãos, fomos um dia: “Vocês estavam mortos em suas transgressões e pecados, nos quais costumavam viver, quando seguiam a presente ordem deste mundo e o príncipe do poder do ar, o espírito que agora está atuando nos que vivem na desobediência. Anteriormente, todos nós também vivíamos entre eles, satisfazendo as vontades da nossa carne, seguindo os seus desejos e pensamentos. Como os outros, éramos por natureza merecedores da ira” (Ef 2.1-3);

c) A criança não pode ser deixada por demasiado tempo em entretenimentos, sejam eles desenhos animados ou não, pois necessitam de educação bíblica. Se uma criança é constantemente abandonada à “babá eletrônica”, como seus pais poderão dedicar boa quantidade de seu tempo no ensino dos preceitos divinos? “Que todas estas palavras que hoje lhe ordeno estejam em seu coração. Ensine-as com persistência a seus filhos. Converse sobre elas quando estiver sentado em casa, quando estiver andando pelo caminho, quando se deitar e quando se levantar” (Dt 6.6,7).

Se esses três itens não forem observados, é apenas uma questão de tempo para que os pensamentos impuros das crianças frutifiquem, não sendo necessárias supostas “mensagens subliminares” para que mergulhem em abominações divinas. Há evidências de que adolescentes entre doze e dezessete anos com maior exposição a conteúdo imoral em mídia televisiva têm maior propensão à iniciação sexual do que aqueles com menor exposição[6]. Logo, expor crianças e adolescentes à imoralidades explícitas, seja por meio da mídia televisiva ou exemplos familiares e sociais, é regar as sementes de pecado plantadas em um terreno extremamente fértil – a “carne”. Adolescentes incrédulos foram, em muitos dos casos, crianças incrédulas filhas de pais cristãos enganados pelo pelagianismo* (*doutrina que ensona que a criança nasce em perfeita santidade morale torna-se pecadora somente após escolher realizar um ato de pecado conscientemente) pós-moderno e que foram negligentes com a disciplina bíblica (“A insensatez está ligada ao coração da criança, mas a vara da disciplina a livrará dela” - Pv 22.15) e com a diligência no ensino da Palavra de Deus, que nada tem de “subliminar”. Aliás, a Palavra de Deus deve corrigir, conscientemente, os pensamentos pecaminosos das crianças (“Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra” - 2Tm 3.16,17).

O gnosticismo é a heresia que está por trás do terror pós-moderno das “mensagens subliminares”. O gnosticismo é a base das “teorias conspiratórias” do mundo de hoje. Para se constatar as semelhanças, basta tomarmos, por exemplo, o evangelho gnóstico de Judas: uma teoria da conspiração de primeira linha! E, semelhantemente aos tempos apostólicos, o gnosticismo continua a deixar as pessoas confusas e inseguras. A ideia de que podemos ser manipulados por aspectos externos ao nosso pensamento não é nova. Os gnósticos do tempo apostólico apregoavam que nossos comportamentos eram produtos de influências externas cósmicas (traços comuns com a astrologia moderna). As “mensagens subliminares” são apenas uma evolução das mesmas ferramentas utilizadas pelos inimigos de Deus numa roupagem mais convincente e engenhosamente “científica”, embora os antigos argumentos ainda tenham muitos adeptos nos dias de hoje (astrologia).

De qualquer forma, não importa como o gnosticismo se expressa nos dias de hoje. Há cinquenta anos ele utilizou os conceitos de “mensagens subliminares” buscando o engano das pessoas. Provavelmente, daqui há cinquenta anos, as teorias conspiratórias buscarão novos “argumentos que só parecem convincentes”. Entretanto, assim como no passado e no presente, a Palavra de Deus foi suficiente para preservar e fortalecer a fé dos santos. E assim o fará no futuro: “Esforço-me para que eles sejam fortalecidos em seu coração, estejam unidos em amor e alcancem toda a riqueza do pleno entendimento, a fim de conhecerem plenamente o mistério de Deus, a saber, Cristo. Nele estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento. Eu lhes digo isso para que ninguém os engane com argumentos que só parecem convincentes” (Cl 2.2-4).

Você está consciente e convencido disso?

Leandro Boer
Membro da Igreja Batista Redenção de São Paulo

Referências:
1.    Treimer M, Simonson M. Subliminal messages, persuasion, and behavior change. J Soc Psychol. 1988 Aug;128(4):563-5.

2.    Subliminal Perception; Philip M. Merikle; Encyclopedia of Psychology (Vol. 7, pp. 497-499). New York: Oxford University Press, 2000.

3.    Marshall SJ, Biddle SJ, Gorely T, Cameron N, Murdey I. Relationships between media use, body fatness and physical activity in children and youth: a meta-analysis. Int J Obes Relat Metab Disord. 2004 Oct;28(10):1238-46. Review.

4.    Thakkar RR, Garrison MM, Christakis DA. A systematic review for the effects of television viewing by infants and preschoolers. Pediatrics. 2006 Nov;118(5):2025-31. Review.

5.    Fouts G, Callan M, Piasentin K, Lawson A. Demonizing in children's television  cartoons and Disney animated films. Child Psychiatry Hum Dev. 2006 Fall;37(1):15-23.

6.    Collins RL, Elliott MN, Berry SH, Kanouse DE, Kunkel D, Hunter SB, Miu A. Watching sex on television predicts adolescent initiation of sexual behavior. Pediatrics. 2004 Sep;114(3):e280-9.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Feng Shui

Se não for o Senhor o construtor da casa, será inútil trabalhar na construção (Sl 127.1).

“A ignorância é, das pestes, a pior”. Que eu me lembre, quem disse essa frase foi o reformador alemão Filipe Melanchton, referindo-se ao desconhecimento de Deus e da sua Palavra. A isso Calvino acrescentou que a filha da ignorância é a superstição. Os dois estavam certos. Com efeito, a ignorância em relação a Deus é uma peste, uma vez que mata a alma das pessoas depois de sugar toda a sua vitalidade. Essa doença faz aflorar a superstição porque o homem que não conhece as verdades espirituais acaba inventando mitos a fim de suprir a sede de algo que vá além daquilo que se pode provar com os sentidos do corpo.

Apesar de Melanchton e Calvino terem vivido há cerca de quinhentos anos, essas frases que disseram ainda estão valendo. E valem para gente de qualquer classe social ou nível intelectual. Uma das provas mais claras disso é o Feng Shui, um jeito de fazer arquitetura e decoração que tem sido intensamente procurado por pessoas do mundo inteiro na hora de construir ou reformar.

O que é exatamente o Feng Shui? A expressão significa “vento e água”. Trata-se de uma tradição chinesa que tem como objetivo dispor os detalhes de uma edificação de tal forma que a “energia” dos seus ambientes fique organizada. Segundo dizem, quando isso é alcançado, essa energia produz harmonia e, então, todos ou quase todos os problemas de uma casa e das pessoas que nela vivem se resolvem. De acordo com essas crenças, o prédio construído e disposto dentro dos padrões de Feng Shui, por levar em conta a “orientação magnética” da edificação e a “influência vibracional” do ambiente, reunirá essas forças de tal forma que ali reinarão a paz, a saúde e a prosperidade.

Como são dignas de pena as pessoas afetadas pela peste da superstição! Pense bem: será que é mesmo possível evitar conflitos no casamento instalando rodapés de trinta centímetros na porta principal da casa, como fazem os que acreditam nessa tradição chinesa? Será que os berros de um adolescente rebelde cederão lugar a palavras doces e amáveis se eu mudar sua cama de lugar e impedir que ele durma debaixo de uma viga de concreto? É mesmo possível que o formato da cozinha abrande o mau gênio da mulher rixosa? Será que a paz interior tão ansiada pelos homens invadirá o coração de quem não trabalha de costas para a porta? Pode mesmo o lar ser feliz, harmonioso e próspero se eu pintar as paredes da sala de outra cor? E se eu instalar um espelho de frente para a entrada principal? Acaso isso pouparia minha família de discórdias, doenças, problemas financeiros e outros desconfortos?  Ora, tenham dó!

Graças a Deus, os crentes foram libertos desses pensamentos fúteis e de tantas filosofias vãs. Como cristãos que conhecem a verdade, sabemos que o lar só pode ser harmonioso se cada membro dele for, ele próprio, uma casa onde Cristo habita (Ap 3.20). Sabemos que a família só será feliz se marido, esposa e filhos desempenharem seus respectivos papéis de forma obediente, cada qual ocupando a função que Deus lhe deu na vida doméstica (Ef 5.22-28; 6.1-4; 1Pe 3.1-7). Sabemos que a paz só existirá no endereço daqueles que permitem que o Espírito Santo – e não a natureza terrena – os domine (Gl 5.16-26; Ef 4.22-32). De fato, sabemos que, se essas coisas não forem reais numa família, a casa será um depósito de frustrações, mágoas, gritarias, desrespeito, medo e infelicidade, não importa o tamanho do rodapé.

Feng Shui – vento e água. O nome, pelo menos, é sugestivo. Na verdade, sugere uma triste realidade. Aponta para a forma como se pode descrever a pessoa afetada pela peste da ignorância – o homem triste que, por falta de instrução, embala crenças supersticiosas. Por nada conhecer de Deus e por ser tão infeliz, tal pessoa ilustra em si mesma o sentido da própria expressão chinesa. Feng Shui – Sim, gente com a cabeça cheia de vento e os olhos cobertos de água.

Pr. Marcos Granconato
Soli Deo gloria

Pornografia É um Gênero Literário?

Gosto muito de poesia! Por isso, tive contato com diversos tipos de literatura e aprendi a gostar, ou pelo menos apreciar, diversos gêneros literários. Tenho alguns livros de autores antigos e mais recentes, além de ótimas antologias que, na verdade, costumam ser o melhor do melhor de diversos escritores.

No afã de desfrutar da criatividade poética de homens e mulheres talentosos, fiquei muito feliz ao ver o livro Os cem melhores contos brasileiros do século, da Editora Objetiva, tendo como organizador Ítalo Moriconi. Trata-se de um livro relativamente grande, com suas mais de seiscentas páginas, editado com ótima qualidade gráfica e uma capa muito chamativa com nomes de diversos escritores.

Fiquei curioso ao ler na contracapa: “Uma antologia livre de academicismos. Uma pesquisa orientada pela qualidade”. Não compreendi o que significava “livre de academicismos”, mas dei um voto de confiança baseado nos nomes consagrados que vi na capa. Entre os autores da primeira metade do século 20 encontrei nomes como Machado de Assis, Lima Barreto, Monteiro Lobato, Graciliano Ramos, Mário de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Érico Veríssimo e vários outros que ainda não tive oportunidade de ler. Entre os autores dos anos 1960 conhecidos por mim estavam Clarice Lispector, Lygia Fagundes Teles e Fernando Sabino. Nos anos 1970, encontrei Adélia Prado que, apesar de escrever em uma época que não produziu obras que aprecio, tem ela minha admiração e um lugar cativo na minha biblioteca. Já entre os escritores das duas últimas décadas do século 20, os únicos nomes conhecidos para mim eram os de João Ubaldo Ribeiro e Luiz Fernando Veríssimo, o que revela meu gosto por literatura antiga e não moderna.

Entre as obras da primeira metade do século, não houve grandes surpresas para mim; apenas deleite, maior ou menor. Porém, entre os textos mais recentes, apesar de muitas coisas interessantes, fiquei chocado com alguns contos de natureza parcial ou completamente sexual. Achei isso uma falta de elegância em um compêndio que traz nomes imortais. Mas lembrei-me que o livro avisa ser “livre de academicismos”. Pensei: “Tudo bem! Apesar de eu não gostar, a obra faz o que se propõe”. No entanto, na sequência da leitura, percebi contos com conteúdo pornográfico que, ao meu entender, pouco tinham de arte e literatura. Obras de uma postura deselegante, agressiva e tremendamente baixa, moralmente falando.

Normalmente, eu deixaria o livro de lado apenas me lembrando que cada obra é compatível com seus autores e colecionadores. Quanto aos leitores, cada um lê o que quer. Entretanto, esse não é o caso do volume que li. Sua primeira edição data de 2001 e, recentemente, o Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Educação, imprimiu na capa do livro o seu selo e o distribuiu aos milhares nas escolas públicas para que adolescentes tivessem pleno acesso a eles. É certo que a maior parte das obras é educativa e necessária à educação dos estudantes brasileiros, mas a falta de critério foi absurda ao deixar “novamente” passar material inapropriado para uma população em fase de formação, não apenas física, mas intelectual e psicológica.

Entre os contos modernos que li, três deles me enojaram ao lembrar que crianças e adolescentes os leriam sob o título de “literatura escolar”. Fiquei até pensando: “O próprio livro não avisa que é desprovido de academicismo? Como, foi (ou está sendo) distribuído pela Secretaria de Educação?”

O motivo da minha revolta é que um dos contos, Flor de cerrado, de Maria Amélia Mello, conta a história de um assalto a uma mulher por parte de um menino. Apesar de não dizer sua idade, ele fica caracterizado com um delinquente menor de idade. O assalto, em apenas alguns olhares e palavras, se transforma em uma cena sensual recheada de palavras obscenas em que o pequeno bandido se torna um amante narcisista, egoísta e rude, sem qualquer respeito pelo sexo feminino, enquanto a mulher, ao que me parece, desiludida da vida, se delicia em receber um tratamento degradante e violento. O garoto vai embora depois do seu crime em total impunidade recebendo o sentimento de gratidão da mulher violentada.

O segundo conto, Obscenidades para uma dona de casa, de Ignácio de Loyola Brandão, conta a história de uma mulher casada, de bom nível social, sexualmente retraída, que passa a receber cartas anônimas com obscenidades dirigidas a ela. O conto começa a narrar a inquietude da mulher diante da situação – por um lado receosa de que o fato viesse a público e, por outro, tendo de lidar com as sensações inéditas que as cartas lhe produziam. Enquanto a narrativa prossegue, trechos das tais cartas entremeiam o texto, em itálico bem chamativo, para fazer referência às lembranças da mulher quanto ao que leu anteriormente ou para descrevê-la lendo a recém-chegada correspondência. O conteúdo desses trechos é “inominável” – usando uma palavra extraída do próprio conto – devido à linguagem extremamente baixa, fundamentalmente pornográfica e, até mesmo, agressiva, além de convites e sugestões no sentido de levar a mulher casada a se encontrar com o amante anônimo e, com ele, fazer coisas que nunca antes sonhou. O final do conto revela que o autor das cartas indecentes endereçadas à pudica senhora era ela mesma.

O terceiro conto a que me refiro tem o nome de Estranhos, de Sérgio Sant’ana. É a história de um jornalista que vai conhecer um apartamento de aluguel muito barato próximo ao morro Dona Marta, no Rio de Janeiro. Chegando à portaria, ocorre a coincidência de uma mulher misteriosa e mal-humorada chegar no mesmo momento a fim de olhar o mesmo apartamento. Os dois vão juntos e, no meio da percepção de que o apartamento às vezes é alvo de balas perdidas vindas da favela, ocorre uma conversa que revela um tipo de vida promíscuo da mulher em comparação ao estilo de vida calmo do jornalista que é fiel à namorada com quem pretende se casar. A certa altura da conversa, os dois acabam por ter uma relação sexual incidental recheada de certos tipos de perversão descritos, mais uma vez, em tons pornográficos. O fim do ato é seguido por uma separação imediata, cada um seguindo seu rumo sem nem sequer saber o nome do outro. Isso acaba por marcar o jornalista que, desinteressado, a partir de então, pelo relacionamento que visava ao casamento, rompe com a namorada e muda seu ramo profissional dentro do jornalismo.

Esses três contos, apesar de interessantes quanto à história, têm como alicerce uma pornografia que deveria ficar restrita às publicações do seu próprio gênero. Entretanto, estão dentro de uma coleção de autores do século 20, alguns deles, literatos consagrados, que está sendo oferecida às crianças e adolescentes da rede pública de ensino pelo próprio governo estadual. Segundo professores e bibliotecários, a procura desse livro pelos alunos é impressionante e não há volumes suficientes para atendê-los. Isso, normalmente, seria motivo de alegria. Mas, nesse caso, é uma procura, não por Graciliano Ramos ou Érico Veríssimo, mas especificamente pelos contos pornográficos. Os alunos sabem até mesmo a página em que devem procurar as frases de linguagem chula.

Portanto, o que as crianças estão buscando gera nelas, com o patrocínio do Estado de São Paulo, o gosto por desvios como: 1) estupro; 2) confiança na impunidade de atos criminosos; 3) infidelidade conjugal; 4) degradação da mulher; 5) sexo casual com completos estranhos; 6) desprezo por relacionamentos monogâmicos.

Soube que, enquanto alguns professores estão revoltados com esse material em suas escolas, há outros que o defendem dizendo ser essa a linguagem das crianças. Ainda que essa seja a realidade de muitas crianças e adolescentes, não há qualquer razão para o Estado favorecer essa condição de violência e de imoralidade. Caso contrário, o Estado deveria também fornecer instrução sobre como abortar um feto ou oferecer feiras de ciências em que se desenvolvessem novos métodos de fabricação de cachimbos de crack. Quem sabe, até educação física voltada a espancamento de grupos minoritários.

Talvez alguém diga que tais literaturas não podem produzir os efeitos alistados acima e que é um exagero clamar contra essas “obras”. Se isso é verdade, o governo estadual, então, está investindo um dinheiro absurdo em algo inútil e incapaz de produzir educação nos alunos. Porém, se a literatura educa e muda a vida dos leitores, a irresponsabilidade governamental é quase sem precedentes. Acaso o secretário de educação de São Paulo não leu Werther, de Johann Wolfgang von Goethe, obra cuja tragédia romântica causou uma onda de suicídios na Europa na época da sua publicação? Ou será que o secretário leu somente o índice do livro antes de aprovar sua publicação e distribuição com o selo estadual e com o dinheiro público?

O que podemos esperar das autarquias brasileiras? Que o governo federal forneça camisinhas para crianças de dez anos enquanto o governo estadual fornece um manual de perversões? Sinceramente, isso é algo que nunca esperei testemunhar. O governo estadual e a Secretaria da Educação devem sentir vergonha do que forneceu aos alunos da rede pública. Os pais e professores devem sentir tristeza pelo que seus filhos e alunos têm aprendido. E a sociedade deve se indignar com atitudes irresponsáveis como essa, de modo que a indignação se revele de dois modos: “cobrando” mudanças, como o recolhimento das literaturas impróprias às crianças e adolescentes, e “promovendo” mudanças por meio das urnas. Essa situação não pode continuar.

Espero que a literatura, como instrumento de educação no bem, volte a tomar o espaço perdido na educação moderna. Temo ver o dia em que coisas como romances, poemas e poesias venham a ser conceitos extintos e desconhecidos pelos jovens, sob a tutela dos órgãos governamentais. Sofro ao pensar que é possível que o mais próximo da literatura que os jovens possam chegar um dia seja Florentina.

Pr. Thomas Tronco