sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A Ceia do Senhor (Final)

O desafio de lidar com 1Coríntios 10 talvez não seja tão difícil. Na verdade, a leitura do v.16 colocada sob a luz do contexto que abrange os vv. 14-22 mostra que, certamente, Paulo não fala da presença espiritual de Cristo nos elementos da ceia, mas sim da comunhão especial que o crente tem com o próprio Senhor durante a celebração dessa ordenança.

Na verdade, o próprio v. 16 fala de “comunhão” (κοινωνία) e não de alimentação ou sustento. Ademais, nos vv. 20-21 fica claro que a preocupação de Paulo se centrava no campo da associação. Com efeito, ele adverte os crentes no tocante à ligação que eles teriam com os demônios caso participassem de festas pagãs. Isso, segundo o Apóstolo, seria inaceitável, uma vez que, na ceia, uniam-se a Cristo, não havendo sentido em terem comunhão com o Senhor e também com os espíritos malignos. 

Assim, 1Coríntios 10.16 não ensina que Cristo está espiritualmente presente nos elementos da ceia. Antes, revela que, ao participar da mesa do Senhor, o crente se associa com ele de forma especial, nutrindo, no momento da celebração, uma comunhão mais íntima com o Senhor, presente sim, de forma intensa durante o rito, mas não nos elementos do rito.

Conforme visto de início, a quarta concepção acerca da ceia é chamada memorial. Essa é a visão segundo a qual a ceia é apenas uma ordenança do Senhor, útil para trazer à memória dos crentes o sacrifício que Cristo realizou no Calvário. Geralmente, essa doutrina é atribuída ao já mencionado reformador Ulrico Zuínglio. De fato, Zuínglio rejeitou qualquer noção sobre a presença de Cristo nos elementos eucarísticos. Para ele, comer a carne do Senhor significava crer nele, de modo que a expressão “isto é o meu corpo” devia ser entendida como uma metáfora.

Deve-se dizer, contudo, que não é correto atribuir a Zuínglio uma concepção memorialista extrema. Isso porque esse reformador via a ceia não apenas como um momento de recordação, alegria e gratidão, mas também como um sinal mediante o qual, como no batismo, o crente comprova sua fé e mostra para a igreja que pertence a Cristo.

Dentre as quatro visões sobre a ceia do Senhor, a que a concebe basicamente como um memorial parece ser a que melhor se harmoniza com o ensino das Escrituras. O próprio Senhor, ao instituir essa ordenança, afirmou: “Fazei isso, em memória de mim”. (1Co 11.23-25).

O memorialismo bíblico, porém, não é do tipo que despreza as realidades espirituais ligadas à ceia. Na verdade, um enunciado que leve realmente em conta a totalidade da evidência neotestamentária deve afirmar que a ceia do Senhor é um memorial que recorda o sacrifício de Cristo, memorial este celebrado em meio a uma realidade espiritual que transcende a experiência regular da igreja, à medida que proporciona aos crentes uma cumplicidade mais plena com o próprio Senhor presente de forma intensa no momento da celebração. Ora, é evidente que, desfrutar de uma cerimônia assim, provocará transformações nos participantes, mais do que meras recordações.

Pr. Marcos Granconato
Soli Deo gloria

2 comentários:

  1. Fala Thomas!!
    Que bom observar que nosso último Cassicíaco foi resumido de maneira brilhante pelo nosso querido pastor Marcos nessa pastoral.

    Um abraço.
    Val Veríssimo

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  2. Verdade, Val. Esse texto fechou o Cassicíaco.


    Thomas

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