Nessa semana, furei meu pé em uma haste de ferro que sustenta uma tenda de nylon instalada no gramado de casa. Depois de ensanguentar minha cozinha, sala, quarto e banheiro, procurei o hospital que atende meu convênio a fim de tomar uma vacina contra tétano. Ouvi, lá, da atendente, que eu deveria procurar tal medicamento na rede pública de saúde. Dirigi-me para a um hospital público e aguardei um bom tempo até ser chamado junto com outras quatro pessoas. Para minha surpresa, os cinco pacientes foram atendidos em apenas 3 minutos. Minha consulta não demorou mais do que o tempo de eu contar para o médico que havia perfurado meu pé em um ferro, ele me perguntar se era o pé direito ou esquerdo – não sei para quê – e, sem nem sequer olhar o ferimento, me receitar duas injeções, a vacina e um antibiótico de largo espectro. Para ser bem sincero, me senti completamente desamparado e sem ter a quem recorrer que pudesse me dar conforto e segurança.
Nesse sentido, toda vez que leio a história da mulher usada por Joabe a fim de fazer Davi receber Absalão de volta em Jerusalém (2Sm 14.1-24), fico abismado com um aspecto em particular: uma mulher desconhecida conseguiu facilmente uma audiência com o rei. Que diferença da realidade atual! Multidões, por vezes, aguardam horas e horas, debaixo de Sol e chuva, para ver de longe uma autoridade famosa como presidentes, reis e primeiros-ministros. Falar pessoalmente com eles? Impossível! Encontrar neles compaixão? Só se outros milhares estiverem sob as mesmas circunstâncias e se a solução do problema tiver repercussão na mídia. Ver tais líderes tomarem decisões justas? A justiça, muitas vezes, é interpretada conforme os interesses dos poderosos.
Concordo que não é uma visão animadora, nem o que nos espera, muito promissor. Entretanto, não perco as esperanças quanto ao futuro, pois me lembro que, após os desmandos dos governantes humanos, haverá quem governe de modo especial. O Salmo 9, cântico no qual o rei Davi louva a Deus por livrá-lo dos inimigos maus e roga que o livra da fúria deles, traz alguns aspectos da função do Senhor como governante.
Em primeiro lugar, ele julga com retidão inabalável. Davi diz que Deus “permanece no seu trono eternamente, trono que erigiu para julgar. Ele mesmo julga o mundo com justiça;” (vv.7,8a). A segunda parte do v.7 diz que Deus “se assentou no trono para o julgamento” (tradução literal). Entretanto, o início do versículo demonstra que essa não é uma realidade momentânea ou dependente das circunstâncias ou dos humores. Trata-se de uma disposição permanente de Deus, pois, para julgar, ele se assenta “eternamente”, le`olam. Nada pode demovê-lo desse intento ou retirá-lo desse trono. Ele é um justo juiz todo o tempo e para sempre.
Em segundo lugar, ele governa soberanamente as nações. O salmista afirma que o Senhor “administra os povos com retidão” (v.8b). O verbo dyn significa, em sentido restrito, “julgar”, o que condiz com a figura do juiz apresentado no início da frase. Mas, em sentido amplo, significa “reinar, governar”. Dado o caráter judicial dos reis da época, os atos de julgar e de reinar vinham da mesma fonte. Por isso, o texto revela que Deus, não apenas pune os maus, mas “dirige” as pessoas. Seu poder faz valer suas decisões. Com Deus não existe aquela máxima tão triste de quem depende da justiça humana: “Ganhou, mas não levou”. A soberania do Senhor se faz sentir quando ele traz uma questão a julgamento.
Em terceiro, ele alivia os oprimidos. O texto diz que Deus é “alto refúgio para o oprimido, refúgio nas horas de tribulação” (v.9). A ausência de justiça por parte dos homens sempre trouxe sofrimento aos fracos. O próprio Deus acusou os israelitas, certa vez, de não promoverem a justiça que ele ordenou: “Este [o Senhor] desejou que exercessem juízo, e eis aí quebrantamento da lei; justiça, e eis aí clamor” (Is 5.7). A injustiça de uns é o clamor de outros. Para ambos, Deus tem um tipo de tratamento: juízo para os injustos e alívio para os que clamam. Ele é um “refúgio”, diz o v.9, nas “horas de fome ou de seca”, le`ittot batzarah, o que, figuradamente, lembra da opressão e da necessidade que passa quem procura a justiça e não a encontra.
Em quarto lugar, ele é acessível aos que o buscam. Davi também diz: “Em ti, pois, confiam os que conhecem o teu nome, porque tu, Senhor, não desamparas os que te buscam” (v.10). Com uma atitude justa e inabalável, é óbvio que Deus é o alvo da confiança dos que dele necessitam e que nele buscam amparo. Contudo, algo notável surge de uma observação atenta do texto. Davi nos conta quem tem esses benefícios por parte de Deus. Diferente do mundo, onde quem é beneficiado são os poderosos em influentes em detrimento dos fracos, o alvo da benevolência e do julgamento reto do Senhor são os que o “buscam”. Enquanto, em Israel, muitas vezes a situação era de príncipes que vendiam sentenças contra os pobres que buscavam seus direitos, com Deus, aqueles que buscam nele amparo, de fato o encontram. O verbo darash reflete a atitude de um servo que, reconhecendo em outro o poder, a capacidade e a justiça, busca-o para sanar seu anseio.
Essa visão é reconfortante para o cristão quando percebe que não há, entre os homens, a quem recorrer. O Senhor é completamente diferente. Ele ama a justiça, odeia o pecado, ama os que o buscam e efetua, poderosamente, a sua vontade. E o melhor de tudo: quando Deus age, nunca é necessário recorrer a outra instância. Com Deus assentado em seu trono, não há comissão de ética, nem tribunal de apelação. Busque-o e recorra a ele!
Pr. Thomas Tronco
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